ROTEIRO HOMILÉTICO – “Quem se exalta será humilhado”

ROTEIRO HOMILÉTICO – “Quem se exalta será humilhado”

ROTEIRO HOMILÉTICO – “Quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado”

22º domingo do Tempo Comum – 28 de agosto

Por Izabel Patuzzo*

Quem se exalta será humilhado e quem se humilha será exaltado

 

I. INTRODUÇÃO GERAL

As leituras propostas para a liturgia deste domingo nos convidam a refletir sobre algumas virtudes importantes na vida cristã: a humildade, a gratuidade e a caridade.

A primeira leitura, retirada do livro do Eclesiástico, exorta a comunidade dos fiéis a trilhar o caminho da humildade. Essa virtude nos torna agradáveis a Deus e às pessoas, ajudando-nos a ter êxito no que realizamos e a conquistar a verdadeira felicidade. Segundo a instrução do autor, a humildade é expressão de sabedoria. Portanto, os sábios não se enchem de orgulho, pois partilham seus conhecimentos para o bem da humanidade.

A segunda leitura propõe aos cristãos deixar o comodismo, a zona de conforto, e retomar as exigências da fé cristã de forma mais radical. É um convite para refazer a experiência do encontro com o Senhor, que um dia os levou à comunhão, ao amor fraterno e à intimidade com ele; aquele encontro que deu sentido à vida cristã.

O Evangelho retrata a participação de Jesus em um banquete. Tomar parte nas ceias ou refeições é um dos temas recorrentes no Evangelho segundo Lucas. Elas representam ocasiões propícias para Jesus e seus discípulos interagirem com diversas categorias de pessoas. As refeições são o ambiente em que se expressam as diversas preocupações do evangelista. No exercício de seu ministério, Jesus participa de vários tipos de refeições com diversos grupos. Durante os banquetes, ele não apenas interage com fariseus, cobradores de impostos, discípulos, pecadores e outras categorias de pessoas, mas também ensina como aproveitar esses momentos para ensinar atitudes importantes na convivência social.

 

 

 

II. COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

1. I leitura (Eclo 3,19-21.30-31)

O texto proposto na primeira leitura define o orgulho como um dos piores vícios, por conta de sua tendência destrutiva. Não há remédio para a aflição do coração orgulhoso, porque a maldade lança suas raízes na arrogância. O autor do Eclesiástico conhecia muito bem a presunção da cultura helênica, que se apresentava como superior a todas as outras culturas. Esse livro foi provavelmente escrito por volta do século II a.C., quando muitos judeus estavam se deixando seduzir pela cultura grega. Diante dessa realidade, o autor sagrado, consciente de que a nova cultura lançava raízes no judaísmo, põe-se em defesa das tradições religiosas e culturais, convencendo seus compatriotas a buscar a sabedoria que vem das Escrituras. A Lei, que outrora foi entregue ao povo escolhido, é o princípio de todo saber. Por ser verdade revelada, não pode ser substituída pela sabedoria proposta pela filosofia helênica.

Segundo o livro do Eclesiástico, a humildade é uma das qualidades fundamentais que precisamos cultivar, pois nos torna gentis e pacientes, virtudes que nos ajudam a combater a soberba. Ser humilde significa ocupar com simplicidade nosso lugar. Humildade não significa esconder nossos talentos, mas pô-los à disposição dos outros, sem humilhar ninguém ou sentir que somos superiores.

 

 

2. II leitura (Hb 12,18-19.22-24a)

Continuando a leitura da carta aos Hebreus, chegamos à última parte. O itinerário catequético proposto pelo autor passa pela exortação à perseverança e constância nas provações; a seguir, a comunidade dos fiéis é chamada a cultivar relações fraternas. A comunhão com Deus supõe a comunhão com os irmãos. Ao estabelecer a comparação da comunidade do Senhor Jesus com a comunidade dos israelitas no monte Sinai, o autor ressalta a graça de ter Cristo como mediador. Se a mediação de Moisés no deserto foi grande bênção para o povo escolhido, a mediação de Jesus nos conduz à plenitude da graça. Assim, estabelece profundo contraste entre a experiência de comunhão com Deus que Israel fez no Sinai e a experiência cristã.

A experiência do Sinai é descrita como vivência que gerou medo, que não foi capaz de quebrar o sentimento de distância entre Deus e as pessoas. O cenário da revelação do Sinai é descrito como assustador, mas Cristo rompeu as barreiras desse distanciamento. Pelo batismo, os cristãos aproximaram-se de Deus de tal forma, que não há espaço para o medo. A caminhada de fé na comunidade cristã é, portanto, experiência festiva, de verdadeira alegria. Por isso, os cristãos concebem Deus como o santo juiz do universo, mas cheio de bondade e misericórdia, e por Cristo se tornaram co-herdeiros da vida eterna.

 

 

3. Evangelho (Lc 14,1.7-14)

O contexto histórico-social retratado no texto de Lucas leva-nos a afirmar que a atitude de Jesus propõe nova estratificação social: quebrar as barreiras sociais, os tabus e costumes acerca das refeições sociais e tentar abrir novas fronteiras, nas quais sentar-se à mesa juntos tem um papel importante na comunidade. Jesus procura criar ao redor de si um grupo com uma estratificação interna totalmente diferente do sistema social de seu tempo. Assim, ele proporciona um sentido totalmente novo à noção de convidados e onde estes devem sentar-se à mesa.

O convite para banquetes, no contexto greco-romano do mundo mediterrâneo do tempo de Jesus, era enviado com antecedência informalmente, de maneira oral, ou formalmente, por escrito. Era externado por mensageiros, normalmente servos, e lido diante das pessoas que estavam sendo convidadas, anunciando que o anfitrião estava preparando o banquete para seus amigos e associados. Assegurar o convite era o objetivo principal, sobretudo para aqueles que buscavam reconhecimento social. Os nobres costumavam convidar grande número de amigos, clientes e pessoas do mesmo nível social, que poderiam retribuir com outros convites semelhantes. A noção de convite para participar de um grande banquete social evidencia as conexões de amizade ou interesses socioeconômicos ou religiosos.

O evangelista Lucas é o único a mostrar a proximidade de Jesus com os fariseus, a ponto de frequentar suas casas e pôr-se à mesa com eles. Os fariseus eram o grupo mais numeroso nas sinagogas. Tinham grande reverência pela Torá, quer escrita, quer oral. Eram fiéis observantes da Lei, mas muito apegados à lei do puro e do impuro, distanciando-se do amor e da misericórdia.

Jesus ensina seus ouvintes a não buscar os primeiros lugares nos banquetes. A refeição da qual ele toma parte se torna ocasião propícia para falar da importância desse momento como preocupação para com os pobres, como chamado à solidariedade com aqueles que carecem de recursos materiais para retribuir semelhantes convites. O clímax de seu ensinamento é que as refeições devem ser espaço de transformação das barreiras sociais. O banquete deve estar a serviço da convivência fraterna entre todas as pessoas, independentemente das classes sociais. Portanto, no banquete do Reino, a noção de aceitação e inclusão daqueles que normalmente não são aceitos pelas convenções sociais se torna um elemento central no discipulado instituído por Jesus.

 

 

III. PISTAS PARA REFLEXÃO

O abismo entre as diferentes classes sociais que compõem nossa sociedade impede a reu­nião, num mesmo banquete, de pessoas de diferentes níveis na escala social. O valor da pessoa se mede por aquilo que possui, pela capacidade de se impor, prosperar, ter êxito, possibilitar a inserção no mundo do poder ou exercer influência na sociedade. As pessoas têm valor pelos cargos que ocupam. Na comunidade cristã, a lógica deve ser outra, porque a lógica do Reino de Deus gera outro tipo de relação, na qual se cultiva a humildade, a simplicidade e o amor gratuito e desinteressado.

Muitas vezes, mesmo nós, cristãos, deixamos nos levar pelo espírito de competição, de quem é o melhor, o maior, buscando visibilidade, lugares de destaque na comunidade, mais do que o servir. Isso gera divisão na comunidade e pode fazer que membros mais simples não tenham coragem de assumir responsabilidades, porque se sentem inferiores ou talvez até experimentem humilhação.

Jesus deixa claro que, entre os discípulos, não deve haver distinção de pessoas. A comunidade cristã deve ser inclusiva, acolher a todos e viver o amor gratuito e desinteressado. Nossas relações não se baseiam em interesses comerciais ou que se fundamentem em honrarias, prosperidade e troca de favores. O Evangelho nos faz pensar sobre quem são os coxos, os cegos, os excluídos que temos de incluir, acolher e servir em nossas comunidades?

 

 

FONTE: Izabel Patuzzo* / https://www.vidapastoral.com.br/

*pertence à Congregação Missionárias da Imaculada – PIME. Mestre em Aconselhamento Social pela South Australian University e em Teologia Bíblica pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. É licenciada em Filosofia e Teologia pela Faculdade Nossa Senhora da Assunção, em São Paulo. E-mail: [email protected]

 

 


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