Homilia de hoje — Liturgia da Missa de 5ª-feira, 05/06/25

Homilia de hoje — Liturgia da Missa de 5ª-feira, 05/06/25
Irmãos e irmãs, hoje somos convidados a mergulhar no coração da oração sacerdotal de Jesus, proferida pouco antes de sua Paixão, conforme nos narra o Evangelho de João (17,20-26).

Ao erguer os olhos ao céu, o Mestre não reza somente pelos Doze, mas por todos os que crerão em sua Palavra ao longo dos séculos, clamando: “Para que todos sejam um, como tu, Pai, estás em mim e eu em ti, para que eles também estejam em nós, a fim de que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17,21).
Nesta súplica encontramos a essência teológica da comunidade cristã: a convocação para uma unidade que ecoa a comunhão trinitária, refletida na vida dos discípulos e projetada para a missão do Evangelho no mundo.

Unidade cristã e a comunhão trinitária
Quando Jesus afirma que aquele “dá-lhe a glória que me deste, para que eles sejam um, como nós somos um” (Jo 17,22), Ele alude a um mistério profundo: o Pai e o Filho compartilham recíproca glória, expressa no movimento eterno de amor do Espírito Santo. A unidade trinitária — o “per-ichorésis” implícito nas Escrituras e tão caro aos Padres da Igreja Oriental — é imagem e medida da unidade eclesial.
Não se trata, porém, de uma uniformidade superficial, mas de uma comunhão de pessoas que mantém a distinção nas hipóstases sem cessar de partilhar substância e ação. Assim, a Igreja, chamada a ser Corpo de Cristo, reflete no mundo essa harmonia misteriosa, onde cada membro contribui com seu dom para a edificação do Reino (cf. 1Cor 12,12-27).
Nas Cartas de São Paulo, sobretudo em Efésios (4,1-6), ressoa a mesma visão: “Um só corpo, um só Espírito, assim como fostes também chamados a uma só esperança da vossa vocação; um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, que é sobre todos, age em todos e está em todos” (Ef 4,4-6).
Portanto, a oração de Cristo não é mero desejo espiritualista, mas fundamento teológico para a existência da comunidade cristã. Sem esta unidade, o anúncio do Evangelho perde a credibilidade, porque o mundo, marcado pela fragmentação e pelas disputas, não consegue crer no Deus que é amor encarnado se os discípulos permanecem divididos.

A glória recebida e a participação na vida divina
Quando Jesus declara: “Pai, aqueles que me deste, quero que estejam comigo onde eu estiver, para que contemplem a minha glória” (Jo 17,24), Ele não fala de uma glória meramente exterior, mas da participação na condição filial do Verbo. «Glória», no Evangelho de João, significa plenitude de comunhão com o Pai, participação no “hilarion” (alegria) sem fim que se manifesta no movimento perene das pessoas divinas. Ao contemplarmos o ressuscitado, somos convidados a experimentar, já agora, esse êxtase místico no qual nosso coração se une ao coração de Cristo.
Nos escritos patrísticos, especialmente em São Cirilo de Alexandria, encontramos a doutrina de que a Encarnação do Verbo visou superabundar a graça em nossas almas, de sorte que a glória de Cristo se torna luminosidade no corpo eclesial.
A Ascensão (Jo 17,5) — embora não ocorrida neste trecho em particular, mas indissociável deste contexto de prece — revelará essa glória a fim de que sua luz ilumine todos os povos. Eis por que a unidade cristã não é apenas um ideal moral, mas uma participação intencional na vida divina: “Eu neles e tu em mim, para que cheguem à unidade perfeita” (Jo 17,23). A “unidade perfeita” só se alcança quando cada cristão se abandona, na caridade, à ação do Espírito, quebrando todo orgulho e dividendo egoísta.

Testemunho do mundo e a missão da Igreja
Jesus compreende que a unidade entre os seus será sinal eloquente para o mundo: “para que o mundo creia que tu me enviaste” (Jo 17,21). Note-se a inversão teológica: não é pela força política, nem pela retórica persuasiva, mas pela dinâmica interna de amor que o mundo reconhecerá o Messias, enviado para reconciliar a humanidade com o Pai.
A partir do Concílio de Éfeso (431 d.C.), os Padres afirmaram que a charis (graça) derramada sobre a comunidade eclesial gera precisamente este testemunho que supera barreiras étnicas, culturais e sociais.
No mesmo sentido, São Cipriano de Cartago exorta: “O Senhor nos ensinou que devemos ser um só corpo. Se há divergências, pereceremos. Se há cisão, não há Igreja.” Assim, a missão eclesial depende desta coesão espiritual: os fiéis, unidos em Cristo, tornam-se “peixes grandes” capazes de arrastar multidões para o Reino. Não basta, então, professar a fé em palavras; é mister que, em nossos encontros dominicais, em nossas pastorais, em nossas comunidades locais, demonstremos concretamente esse amor que perdoa, que aceita o outro em suas fraquezas e deficiências.

Implicações espirituais para a vida cotidiana
A meta da “unidade perfeita” deve permear nosso convívio familiar e social. Em cada pequena parcela do dia a dia—no perdão que oferecemos ao cônjuge, na paciência que damos aos filhos, na caridade com os pais idosos—estamos participando do mesmo movimento de reconciliação que Cristo nos legou. Quando superamos o critério egoísta de “ganhar a discussão” e buscamos a concórdia, tornamo-nos mensageiros vivos do perdão divino.
Além disso, a unidade cristã nos impulsiona a rezar pelos inimigos, a alimentar os pobres, a visitar os enfermos e a consolar os aflitos. Cada gesto de compaixão e solidariedade é expressão sacramental desse amor trinitário que nos une a Jesus e ao Pai. É assim que o mundo verá — não em discursos eloquentes, mas em ações concretas — “que tu me amaste, como amaste a mim” (Jo 17,23). E, por sua vez, conhecerá o Deus justo que se fez próximo no Verbo encarnado.

Conclusão
Queridos irmãos, a oração de Cristo por nós permanece ecoando nos séculos: “Para que assim eles cheguem à unidade perfeita” (Jo 17,23). Que possamos, a cada dia, pedir ao Espírito Santo que dissipe todo orgulho, todo rancor e toda indiferença que nos afasta do amor fraterno.
A unidade não é somente meta futura: ela se concretiza nas escolhas ordinárias de nossa existência, quando preferimos escutar em vez de julgar, quando perdoamos em vez de condenar, quando acolhemos em vez de excluir.
Ao contemplarmos o Cristo glorificado, recordemos que fomos “tomados do mundo” (Jo 17,14) para sermos presença viva do Reino no meio dos homens. Assim como Ele vive em nós (“e tu em mim, para que eles também sejam um em nós” – Jo 17,21), permitamos que nossa vida comunitária seja reflexo do rosto misericordioso do Pai.
Sejamos, portanto, artesãos de reconciliação, construtores de pontes, testemunhas fiéis de que o amor que habita em Jesus consegue transfigurar corações e transformar realidades.
Que a Virgem Maria, Mãe da Igreja e modelo de perfeita unidade com Cristo, interceda por nós, para que nos encontremos sempre unidos em oração, em caridade e em missão, até alcançarmos, no Céu, a unidade plena para a qual fomos criados. Amém.